quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

Longa manus

Pessoal, dia deste, acompanhando uma revisão de processo penal feito pelo meu amigo @JeffersonSB_, através do Twitter, percebi que foi levantada uma questão interessante.

O assunto era a remessa dos autos de inquérito policial ao Procurador-Geral de Justiça para fins do artigo 28 do CPP.

Como se sabe, o Juiz, ao discordar da promoção de arquivamento de inquérito policial feia pelo Promotor de Justiça, deverá remeter os autos ao Procurador-Geral de Justiça, que poderá ele próprio oferecer denúncia, designar outro Promotor para oferecê-la ou insistir no arquivamento, caso em que o Juiz estará obrigado a arquivar.

Surge então a primeira indagação: caso o Procurador-Geral de Justiça designe outro Promotor para fazer a denúncia, este é obrigado a oferecê-la? Respeitando-se entendimentos contrário, tem prevalecido que sim.

Agora, a segunda indagação: esta obrigatoriedade do oferecimento da denúncia não fere a independência funcional do Promotor? Entendemos que não. Explica-se:

A independência funcional, garantia do membro do Ministério Público (assim como do Judiciário), se revela pela liberdade de convicção, amparada em lei, acerca do fato sob análise.

Só há de se falar em convicção sobre um fato, com a consequente independência funcional para analisá-lo, quando o órgão possuir atribuição (ou competência, no caso dos Juízes) para apreciar a questão.

Vejamos: inquérito policial é remetido para o Promotor com atribuição para apreciá-lo. Com base nos elementos dos autos, o Promotor decide promover o arquivamento. Quando o juiz, ao discordar do arquivamento, remete os autos ao Procurador-Geral de Justiça, ocorre a mudança da atribuição para apreciação do caso do Promotor originário para o Procurador-Geral de Justiça. Assim, este passa a ser o órgão com atribuição para análise do caso.

No momento em que o Procurador-Geral de Justiça designa outro Promotor para oferecer denúncia não se estará mudando novamente a atribuição, mas tão-somente se outorgando a tarefa de oferecê-la. A atribuição continua sendo do Procurador-Geral de Justiça.

Dessa forma, a obrigatoriedade do Promotor em oferecer a denúncia não fere sua independência funcional pelo simples motivo de que não é facultado a ele formar sua convicção, pois não é o órgão com atribuição para tanto. Funciona ele como longa manus (extensão) do Procurador-Geral de Justiça. Na verdade, é como se o Procurador-Geral de Justiça estivesse oferecendo a denúncia.

Aos estudos!

quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

Julgamento antecipado da lide

Pessoal, o Rodrigo nos trouxe a seguinte pergunta extraída da prova discursiva para Delegado de Polícia:

Avalie, justificadamente, a possibilidade de julgamento antecipado da lide no processo penal brasileiro.

Pois bem. Interessante a pergunta!

Não podemos negar que o conceito de julgamento antecipado da lide está muito bem exposto no art. 330, do CPC. Portanto, emprestemos tal conceito do ramo processual civil:

O juiz conhecerá diretamente do pedido, proferindo sentença:
        I - quando a questão de mérito for unicamente de direito, ou, sendo de direito e de fato, não houver necessidade de produzir prova em audiência;
        II - quando ocorrer a revelia (art. 319).


Por uma simples leitura do dispositivo acima notamos que somente poderemos falar em julgamento antecipado da lide quando houver decisão quanto ao mérito da questão, pois a expressão o juiz conhecerá diretamente do pedido induz que ele analisará a matéria de mérito. Doutro lado, a sentença de  extinção do processo sem julgamento do mérito não analisa o pedido.

Sabemos que não há a possibilidade de aplicar os efeitos da revelia no processo penal. Com efeito, o processo ficará suspenso caso o réu, citado fictamente, não compareça ao processo ou não constitua advogado. Da mesma forma, o processo penal não dispensa a comprovação dos fatos por parte do autor no caso do réu, efetivamente citado, abandonar os atos do processo.

Mas será que poderá haver no processo penal julgamento antecipado com base na dispensa de produção de provas em audiência?

Vamos analisar o art. 395 do CPP:

A denúncia ou queixa será rejeitada quando: 
        I - for manifestamente inepta;
        II - faltar pressuposto processual ou condição para o exercício da ação penal; ou 
        III - faltar justa causa para o exercício da ação penal.


Poderia este artigo ser considerado julgamento antecipado da lide? Pelo conceito acima exposto entendemos que não. Notem que a regra trata dos casos de rejeição da denúncia ou queixa. Em todas as hipóteses não há apreciação do mérito, não havendo, portanto, julgamento antecipado. A rejeição da denúncia ou queixa, apesar de extinguir o processo, não faz coisa julgada material, podendo a ação ser novamente proposta caso preenchida as condições de admissibilidade da ação.

Vejamos, agora, o artigo logo adiante; 397 do CPP:

Após o cumprimento do disposto no art. 396-A, e parágrafos, deste Código, o juiz deverá absolver sumariamente o acusado quando verificar:
         I - a existência manifesta de causa excludente da ilicitude do fato;
        II - a existência manifesta de causa excludente da culpabilidade do agente, salvo inimputabilidade;
        III - que o fato narrado evidentemente não constitui crime; ou
        IV - extinta a punibilidade do agente.



Percebam que a redação mudou: o juiz deverá absolver sumariamente o acusado. Todas as hipóteses elencadas no artigo pressupõem análise do pedido e permitem ao juiz proferir sentença de mérito de forma antecipada. Trata-se, portanto, de hipótese de julgamento antecipado da lide.

Tal raciocínio também deve ser feito nos casos de absolvição sumária no júri (art. 415). Aqui cabe uma observação: o fato da absolvição ser proferida após audiência de instrução não lhe retira o caráter de julgamento antecipado, pois a decisão, de mérito do caso, antecipa o julgamento que seria feito pelo juiz natural da causa, que é o conselho de sentença.

Ainda nos valendo do mesmo raciocínio, podemos afirmar que as sentenças de pronúncia e impronúncia não são hipóteses de julgamento antecipado, uma vez que se tratam de decisões que não adentram no mérito da causa.

Mais um artigo merece nossa atenção. É o art. 6º da Lei 8.038/90, que trata do procedimento da ação penal nos crimes de competência originária do STF e STJ. Diz ele que, após o oferecimento da denúncia e resposta do denunciando, o relator pedirá dia para que o Tribunal delibere sobre o recebimento, a rejeição da denúncia ou da queixa, ou a improcedência da acusação, se a decisão não depender de outras provas.

De igual modo, usando nosso raciocínio sobre o conceito de julgamento antecipado, podemos afirmar que somente no caso de improcedência da acusação haverá julgamento antecipado, não incidindo tal instituto na  rejeição da denúncia ou da queixa.

Mas notem um peculiaridade: o julgamento antecipado da lide no processo penal somente é possível nos casos de absolvição do réu. Caso o decreto seja condenatório, haverá de se esgotar os meios de provas.

Aos estudos!

sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012

Mais cobradas

Pessoal, vamos dar uma relembrada em cinco pontos de direito penal muito cobrados nas provas preambulares de concursos:

1 – Arrependimento posterior (art.13,CP): que ele só cabe nos crimes cometidos sem violência ou grave ameaça à pessoa todo mundo sabe. O “x” da questão é saber se a reparação do dano ou a restituição da coisa deve ser feita até o recebimento ou oferecimento da denúncia ou da queixa. E o art. 13 diz que deve ser feita até o recebimento. Os concursos adoram explorar esta questão.

2 – O erro de tipo exclui? Aí o pessoal faz uma confusão tremenda com erro de tipo e erro de proibição... Erro de tipo: falsa percepção sobre os elementos objetivos do tipo; sempre exclui o dolo; se escusável (ou inevitável) exclui também a culpa; se inescusável (ou evitável) exclui somente o dolo, permitindo a punição na forma culposa, se houver.
Erro de proibição: falsa percepção sobre a ilicitude do fato; se escusável (ou inevitável) exclui a culpabilidade; se inescusável (ou evitável) diminui de um sexto a um terço a pena.
E as descriminantes putativas? Aí é assunto para outro post!

3 – As sentenças e as revogações: outra questão muito explorada é a relação: sentença irrecorrível/cometimento de crime e revogação dos benefícios. Vamos a elas!
Sursis - revogação obrigatória: sentença irrecorrível por crime doloso
 - revogação facultativa: sentença irrecorrível por crime culposo ou por contravenção, a pena privativa     de liberdade ou restritiva de direitos.

Livramento condicional - revogação obrigatória: sentença irrecorrível por crime cometido durante a vigência do benefício, a pena privativa de liberdade.
- revogação facultativa: sentença irrecorrível por crime ou contravenção, a pena que não seja privativa de liberdade.

Suspensão condicional do processo - revogação obrigatória: ser processado por outro crime no curso do benefício.
- revogação facultativa: ser processado por contravenção no curso do benefício.

4 – Representação e Decadência: que a perda do direito à representação, nos crimes de ação pública condicionada, e a decadência, nos crimes de ação privada, ocorrem seis meses após o conhecimento da autoria do crime, todos sabem. Mas, a representação será irretratável após o oferecimento ou recebimento da denúncia? Após o oferecimento.

5 – As regras dos concursos de crimes são levadas em consideração no cálculo da prescrição da pena? A maioria dos concurseiros tende a achar que sim. Contudo, a soma das penas no concurso material e a exasperação no concurso formal e no crime continuado não são consideradas no cálculo da prescrição. O cálculo será feito em cada crime, de forma isolada. E não pensem que isso é entendimento doutrinário ou jurisprudencial; trata-se da regra do art. 119,CP.

Aos estudos!